quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

"Julgar ou exortar? O que fazer? Como fazer?"




"Eu te conjuro em presença de Deus e de Jesus Cristo, que há de julgar os vivos e os mortos, por sua aparição e por seu Reino: prega a palavra, insiste  oportuna e importunamente, repreende, ameaça, exorta com toda paciência e empenho de instruir" (2 Tm 4, 1-2).

Todos nós filhos de Deus e conhecedores do seu amor e de suas leis temos por obrigação alertar, exortar, nossos irmãos quanto ao que é reto e agrada à Deus, quanto às coisas que nos aproximam de Deus e as que nos afastam. Contudo, devemos saber que á uma tênue diferença entre exortar e julgar. Podemos em meio a uma exortação acabar julgando, assim como a recíproca pode ser verdadeira.
Então qual seria a diferença? Julgar exige sentença e punição e exortar é alertar, com amor e misericórdia o outro para aquilo que julgamos inconveniente ou arriscado. Portanto, podemos perceber que exortação não tem nada haver com julgamento. A palavra exortar vem do grego parakalesei que significa habilidade de animar, motivar, confortar, encorajar e advertir. E julgar vem do latim judiciare, que significa decidir como juiz ou árbitro, avaliar, lavrar ou pronunciar sentenciar. Como disse Jesus no capítulo 6 do Evangelho de São Lucas:

"Sejam misericordiosos, assim como o Pai de vocês é misericordioso.
Não julguem, e vocês não serão julgados. Não condenem, e não serão condenados. Perdoem, e serão perdoados.
Pode um cego guiar outro cego? Não cairão os dois no buraco?
Por que você repara no cisco que está no olho do seu irmão e não se dá conta da viga que está em seu próprio olho?
Hipócrita, tire primeiro a viga do seu olho, e então você verá claramente para tirar o cisco do olho do seu irmão".

Nenhum homem é capaz de julgar o outro, somos todos fracos e pecadores. Nenhum ser humano alcançou o direito de exercer julgamento sobre outros, se não o próprio Filho  de Deus, por meio de Sua morte e ressurreição. A maior expressão de Sua Palavra é o Seu próprio Filho, o Verbo que se fez carne e habitou entre nós. Jesus dividiu a história e seus ensinos continuam a dividir a alma do homem de maneira que uma vez que tenha uma revelação de quem Ele é imediatamente se encontrará em um vale, entre a cruz e a espada, e precisará fazer uma escolha.
De fato não fomos chamados para julgar, mas há um chamado que pesa sobre todo aquele que obedece às palavras da verdade, que é exortar todo aquele que anda desordenadamente para que se arrependa e volte a caminhar pelo caminho de Vida. Se nos omitirmos de fazer isso, por autoestima ou qualquer coisa que seja, estaremos expressando o amor com que fomos amados? Estaríamos amando o nosso próximo uma vez que estamos vendo que a luz que há nele são trevas e mesmo assim não fazemos nada? É certo que não há amor nisso!
Corrigir os que erram é obra de misericórdia espiritual. Mas como fazer isto sem julgar? Exemplos:

Um pai ou mãe ensina a criança: “vai estudar meu filho, para você ser alguém na vida, o que você quer ser quando crescer?... ahh, mas então tem que ler bastante.... blá blá blá... 

Julgar:
"ahhh, mas você é burro mesmo hein? Desse jeito não vai ser um nada na vida... vai estudar seu preguiçoso... Quer ser o quê?!! Hein? Um chinelão? Vagabundo? blá blá blá....

Não podemos ser acusadores!!! Temos que ser como Jesus foi com a Samaritana: “Disseste bem que não tens marido. De fato, tiveste cinco maridos, e o que tens agora não é teu marido” (Jo 4, 17-18). À primeira vista, parece uma acusação: Jesus apontando o erro da samaritana... Mas ao lermos este capítulo 4 do Evangelho de São João, dos versículos 1 ao 42, vemos como é nítido amor de Jesus por ela! Ele a acolhe e mostra-lhe o Caminho, a Solução, a Água Viva. A reação dela não é de quem foi acusada de algum erro, mas de alguém que foi contemplado pela ação misericordiosa de Deus: “A mulher deixou a bilha e foi à cidade dizendo às pessoas: ‘Vinde ver um homem que me disse tudo o que eu fiz. Não será ele o Cristo? ’” (Jo 4, 28-29).
O Evangelho deixa claro para nós a felicidade da samaritana e a vontade de fazer com que outros experimentem o que ela experimentou: enxergar a verdade, que é o próprio Jesus (Jo 4, 39ss). E aí está a grande descoberta: exortar é um ato de amor, de misericórdia! Feliz aquele a quem Deus corrige porque “o Senhor corrige os que ele ama como um Pai, ao filho preferido” (Pr 3,12)
Exortar se torna um ato difícil por causa do egoísmo, da inveja, do respeito humano... E assim colocamos uma linha muito fina entre o que é exortar e o que é acusar... Muitas vezes temos até a boa intenção de exortar, mas não conseguimos. Agimos como aqueles que queriam apedrejar a mulher adúltera, cegos e prepotentes, como se fôssemos menos pecadores que os que estão a nossa volta (Jo 8, 3-9).
Peçamos a Deus a graça do discernimento e da sabedoria, para sermos instrumentos dóceis de correção fraterna! Observemos então nossos atos. Se, ao corrigir alguém, buscamos levar nossos irmãos para o céu conosco, estamos exortando. Se buscamos agradar nossas vontades, nossos gostos, nossa maneira de ser ou pensar, então está acusando. E neste ponto podemos enumerar algumas diferenças entre exortação e acusação, baseadas em nossas atitudes. Quem exorta também ouve. Quem acusa só fala, critica e dá ordens. Quem exorta mostra os erros, mas busca e enfatiza as soluções. Quem acusa geralmente não conhece soluções ou nem pensou nelas. Quem exorta caminha junto. Quem acusa abandona.
A exortação leva ao crescimento, a acusação à destruição do próximo. Quem exorta pode fazer grandes amizades. Quem acusa gera indignação e inimizade. Quem exorta anima e dá coragem. Quem acusa frustra e fere a autoestima do próximo. Aquele que exorta se humilha porque pode não ser escutado, e exalta o próximo porque quer vê-lo no céu. O que acusa, ao contrário, só humilha o outro e se exalta porque está “sempre certo”. O que exorta, ama! O que acusa, despreza... Deus exorta... E o inimigo acusa. E você?
Então exortar tem uma conotação mais amorosa, mas com certo ar de ordem, para disciplinar o outro, já julgar você estabelece uma crítica sem fundamento, ou mesmo fundamentada não compete a nós dizer sentenciar o outro, puni-lo.
E só com base nisso podemos ser bênção na vida dos nossos irmãos, e assim como João, poder mostrar Jesus a aqueles que estão perdidos ou a aqueles que não O conhecem.E a nós, que agora estamos reunidos e somos povo santo e pecador, dai força para construirmos juntos o vosso reino que também é nosso” (Oração Eucarística V).

  Anne Karoene S.F.



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